Ponte para a alma

Recordas-te de cada vez em que me agarraste a mão e ficaste a olhar para ela? Lembraste? Costumavas entrelaçar os nossos dedos e começavas a baloiçar o braço como uma criança pequena, fazias-me sorrir, tanto por dentro como por fora. Eram gestos teus, tão simples, tão únicos que passavam despercebidos a qualquer pessoa que passasse por nós. Estou a sorrir para o meu teclado, só isso já indica que a mim não me passavam ao lado. Gostava tanto quando olhavas para mim, tanto, tanto. Nós nunca precisámos de palavras para saber o que ia no pensamento um do outro. Desde os nossos olhares envergonhados aos mais estúpidos com as caretas que costumavas fazer. Sentia-me vista, pela primeira vez. Olhavas para mim e vias-me. Vias-me a mim! Não me canso de dizer isto, passo a mão pelo cabelo como quem anseia voltar atrás no tempo. E rapidamente me apercebo que não me é permitido. Tinhas um brilhozinho nos olhos tão teu, e o que sentias ia directamente para lá. Quando estavas triste e dizias que estava tudo bem só para eu não me preocupar eu sabia que algo de errado se passava, estava nos teus olhos, aos olhos de toda a gente. Só não via quem não olhasse para ti com olhos de ver. Costumavas envolver-me num abraço, lembraste? Quando eu fugia de ti e tu corrias que nem um louco atrás de mim e me punhas sobre o teu ombro? Ficava tão envergonhada quando fazias isso no meio das pessoas. Tu sempre te riste da minha cara, eu não conseguia disfarçar. Houve uma altura em que cheguei a pensar que fazias isso apenas para me irritar, no bom sentido. Houve uma vez em que me olhaste nos olhos e disseste: gosto tanto quando te irritas. Nesse momento, apeteceu-me dar-te um estalo e perguntar-te o que tinhas na cabeça. Mas não consegui, nem queria, foi apenas aquela vontade feminina que flúi de entre as veias. Tantos bons momentos, tantas promessas, tantos sonhos, tanta fantasia. Prometeste que juntos iríamos até ao céu, fizeste-me acreditar em cada palavra tua, e eu acreditei. Cegamente, mas acreditei. Acreditei quando me disseste amo-te, não duvidei uma vez que fosse. Não culpo o amor, não vale a pena dizer que os homens são todos iguais e que tu apenas me querias para o que se diz. Não vale a pena ir por esse caminho. Eu admito, admito perante quem quer que seja, a culpa foi minha. Eu queria tanto que tudo desse certo. Queria tanto ter-te junto a mim para sempre, que acreditei. E cada abraço, cada carícia, cada momento que me davas só me fazia querer mais e mais. E por isso, deixei-te entrar. Deixei que me possuísses de todas as maneiras que uma mulher pode ser possuída. Possuíste-me de corpo, de alma e coração. Fui tua, e tu nunca soubeste ver isso. Partis-te e deixaste-me aqui, do outro lado do mar. Partiste para a outra margem dizendo: mereces melhor que eu. Tu eras a ponte da minha alma. Ainda hoje me pergunto: para quê melhor, se és tu quem eu quero? Já passaram dias, semanas, meses. Dez mais precisamente, e eu ainda tenho o teu toque cravado na minha pele. Não te amo, digo-to com clareza. Não te odeio, não me é possível. Eu choro de raiva, raiva por não ter respostas ás perguntas que me atormentam. Apenas, não me consegues ser indiferente. As pontes permitem a passagem entre duas coisas distantes. Tu ligavas-me á fantasia. Está tão distante da minha realidade. Rita Francisco, 2 de Junho de 2008
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publicado por Lébasi às 21:28